dimanche 7 septembre 2014

enfermagem no Québec (post em português) - capitulo 3

Hora de falar sobre o dia-a-dia de uma enfermeira em région!

Para os interessados, aqui os capitulos anteriores =
capitulo 1
capitulo 2

Larguei o bloco, voltei temporariamente pro Brasil, e aguardei por la o resultado do exame da OIIQ. Eu passei de primeira no exame (so ele daria um post, mas mudaram as regras entao deixo para quem esta mais fresquinho no tema!). A situaçao familiar estava resolvida e foi do Brasil  mesmo que organizei uma entrevista para a cidade de Témiscaming!


Voltei, fui fazer a entrevista la onde o Judas perdeu as meias, a cidade de Témiscaming, que chamarei apenas de *Témis*, 7h de Montréal, mas num local lindo-lindo-lindo! (duvida ? Confira aqui = Témis, site da cidade). Conjoint e eu ficamos encantados. A viagem e hospedagem para a entrevista foram pagas pelo hospital, mesmo se eu nao aceitasse a oferta de trabalho (como somos mimadas, como enfermeiras!). Apos uma reflexao nao muito longa e uma conversa com conjoint, decidimos: **vamos encarar** e aceitei! Eu seria infirmière clinicienne num hospital com 6 leitos. Sim, nao digitei errado. O HOSPITAL tinha seis leitos, que podiam virar 11 caso usássemos o corredor.


source : http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/7/7e/Ville_de_T%C3%A9miscaming.jpg


Como infirmière clinicienne de um hospital tao pequenininho, nao da nem para comparar com o que eu tive como estagiaria! La era mais um centro de estabilizaçao, casos complexos eram rapidamente dirigidos aos centros de North Bay (ON) ou Gatineau (QC). O que tinhamos, entao? Algumas descompensaçoes  pulmonares, cardiacas e diabéticas, pneumonias e outras infecçoes dificeis de serem controladas no comunitario,  reabilitaçoes em pos cirurgias (efetuadas em outros hospitais, obviamente!), crianças com quadros infecciosos simples e casos psiquiatricos como tentativas de suicidio e depressoes, além de (muitos) casos paliativos onde a pessoa havia decidido finalizar seus dias no hospital.


Foi la que eu acompanhei, pela primeira vez na carreira, uma pessoa morrer. Ja tive pacientes que morreram, mas naquele esquema,  **nunca no meu plantao**! Em Témis eu fazia plantoes de 12h, alternando 1 mês de dia e 1 mês de noite. Eram 3 ou 4 dias trabalhando direto, e 3 ou 4 dias de folga. Nada de 12x36, nao! O corpo sofreu um baque, confesso. Descobri que odeio trabalhar de noite! O mês *diurno* passava muito rapido e o mês *noturno* era interminavel, eu chegava em casa às 8h, tomava um café da manha e dormia. Dai acordava la pelas 4 da tarde, tomava banho, comia algo e ia pro trabalho! Aff, como aguentam as enfermeiras que fazem noturno ha 1000 anos ? A sensaçao era de trabalhar e trabalhar, so isso ...


Mas, afinal, quais eram as rotinas no micro-hospital, que é esse o objetivo da novelinha?


Durante o dia, eramos eu e um PAB. Durante a noite, eu estava sozinha. Entao durante o dia acabavamos fazendo tudo junto, o PAB e eu: passar os cabarets de agua, servir as refeiçoes, fazer os cuidados de higiene, mobilizar os pacientes ... Na parte de medicamentos, a maioria recebia apenas comprimidos, apenas 1 ou outro tinha um acesso venoso. Sangue? Era rarissimo, precisavamos **importar** da cidade de Ville Marie, avisando com 24h de antecedência! NPP? Nem pensar! Mas tinha muita morfina, especialmente SC, com cateter. Alguns com SVD, alguns com O2 ... alguns curativos e até alguns pacientes com monitor cardiaco , mesmo sendo um mini hospital possuiamos telemetria, super chique rs! Mas a telemetria permitia 2 pacientes no monitor, maximo dos maximos!  Confesso que nao tinha muitos desafios técnicos, nao. Quem fazia as punçoes para os exames de laboratorio era a propria técnica de laboratorio, exceto quando deveriam ser feito bem cedinho (ela começava às 8h30). O grande desafio era organizar os 6 leitos! Teoricamente o hospital teria 8 leitos, tinhamos 3 quartos duplos mas um deles era **emprestado** para o CHSLD do segundo andar, 1 quarto individual de isolamento (das antigas, com antecâmara e tudo) e 1 individual de psquiatria (com janelinha, portas especiais, tranca externa e todo o kit). Quase todos possuiam banheiro, exceto 1 dos quartos duplos. OBVIO que quando o hospital estava vazio, os pacientes preferiam um quarto com banheiro, mesmo se fosse no quarto de isolamento. Alguns reclamavam que preferiam ficar até no quarto psiquiatrico! Era o grande problema, pois a regra era ocupar os quartos duplos em primeiro lugar, sempre. Organizavamos de tal maneira a deixar quartos privativos, so usavamos como quarto duplo se nao tivessemos mesmo opçao. Em geral tinhamos uns 4 ou 5 pacientes internados ... Parece bobinho como problema, né? Mas tente fazer isso numa comunidade com 3mil pessoas? Todos sabem que o hospital esta vazio e que a **novata da enfermeira** nao colocou o tio-de-Cicrano-e-marido-de-Beltrana num quarto privativo! O plantao começava em geral com esse topico, participavam da passagem de plantao os médicos do hospital (no minimo 3, a cidade possuia 5), o enfermeiro-chefe, a ASI (eram o mesmo enfermeiro-chefe e ASI para todo o CSSS!) e os enfermeiros da noite e da manha. As vezes éramos mais pessoas na passagem de plantao do que pacientes internados! Burocraticamente, durante a manha era o enfermeiro e nao o ASI que tinha que comunicar com a farmacia em Ville Marie, organizar o transporte adaptado, preencher a papelada de rotina ... o ASI (que também era enfermeiro-pivot em oncologia) estava mais como suporte e o enfermeiro-chefe resolvia os grandes problemas de todo o *complexo* (hospital, CHSLD, CLSC, laboratorio, Raio-X, fisioterapia e nutriçao).


Durante a noite a rotina era bem simples. Além de medicamentos e cuidados de base, como oferecer o lanche da noite, ajudar nas trocas de roupa e fraldas e efetuar as mudanças de decubito (nesses dois ultimos procedimentos o enfermeiro da urgência ou o enfermeiro auxiliar do CHSLD me ajudavam = aqui eles priorizam bastante a ergonomia e seguem os principios PDSB, principes de placement sécuritaire des bénéficiaires) eu fazia as fichas de medicamentos pro dia seguinte, organizava os prontuarios, deixava a casa em ordem e ficava de stand-by caso chegasse uma urgência. Como eramos 3 a trabalhar durante a noite (1 enfermeiro na urgência, eu na unidade hospitalar e um enfermeiro auxiliar no CHSLD, que ocupava o segundo andar do prédio) nos revezavamos na pausa noturna, podiamos fazer até 2h de soneca :-) O que era bom, na maioria das vezes as noites eram calmas. Meu horario preferido da pausa-soneca era entre 2 e 4 da manha, mas todos gostavam desse horario, entao a gente revezava. Era bem democratico e as equipes trabalhavam em harmonia!


Quando uma urgência chegava (um telefone vermelho no meio do postinho de enfermagem que tocava desesperadamente nos avisando da chegada da ambulância) o foco do hospital era estabilizar e transferir. E eu ajudava meu colega de urgência, instalando a sonda ou a punçao venosa, colocando os monitores e fazendo as ligaçoes para os técnicos de RX e de laboratorio. Eu nunca fui e nunca serei uma enfermeira de urgência! Nao era incomum pedirem para que eu acompanhasse o paciente na ambulância para os transporte até os centros hospitalares, a viagem mais longa que fiz foi de umas 3,5h até a cidade de Subdury, para encaminhar um caso de IAM. (sim, as pessoas infartam no interior! = e tinhamos a streptokinase à maos!) Mais de 8h de hora-extra ao todo, so com o que recebi nesse dia em me paguei uma boa escapada de fim de semana hehe (hora-extra é 1,5x o valor da hora normal!) .... Eu passo super mal viajando na parte traseira da ambulância, entao antes de sair eu ganhava um Gravol, o pessoal morria de rir com isso. Eu curtia fazer os transfers, era um momento de adrenalina relativamente controlada. Saia com uma prescriçao médica e medicamentos em maos, ja que os techniciens ambulanciers nao podem administrar nada além do que é regulamentado pela lei = Nitro, AAS, Salbutamol, Epinefrina e Glucagon. FELIZMENTE nenhum dos meus transfers **empepinou** e todos chegaram vivinhos da Silva aos hospitais de destino! Andar de ambulância é uma aventura em si, e em estradas de région, a aventura é dobrada!



Eu peguei um **boom** no micro-hospital, chegando a ter 11 pacientes internados, e isso por quase 10 dias! O enfermeiro-chefe e a ASI ficaram doidinhos, nesse periodo eramos, na unidade de internaçao, 3 profissionais durante o dia (1 enfermeiro, 1 enfermeiro auxiliar e 1 PAB) e 2 durante a noite (1 enfermeiro e 1 PAB), ou seja, da-lhe mais e mais pagamento de horas extras! Em région a retençao de profissionais é bem dificil, e o hospital tinha varios enfermeiros de agência, especialmente para cobrir as férias da equipe de urgência. Eles queriam me formar para atuar na urgência, mas minha resposta era sempre *non, non, merci*, aquilo nao era para mim (mesmo sabendo que em région as urgências-urgentissimas acabam sendo raras, em 1,5 anos eu ajudei alguns casos bem dificeis, como um acidente de trabalho que massacrou a perna de um rapaz, um acidente com serra elétrica que cortou um braço ao meio, casos de EAP e IAM e mesmo um caso de drogue du viol. Urgência nao é minha praia, nao mesmo!!)


Trabalhar na unidade de internaçao do micro-hospital era um aprendizado, a medicina rural é bem interessante, eu tive otimas oportunidades de exercitar a tal da *relation d'aide*. Vi pacientes morrerem serenamente, outros em rush. Criei bons vinculos com pacientes e sua familias, vi crises homéricas e brigas de familiares. Acompanhei casos de vizinhos, todos acabavam por se conhecer na cidadezinha. A relaçao com os médicos, com as 2 profissionais de fisio (1 fisioterapeuta e 1 técnica em reabilitaçao),com a nutricionista e com as técnicas de laboratorio e de raio-x era fantastica! Como enfermeira, podia nao ter muitos desafios técnicos, mas tinha enormes desafios humanos. E por isso, até hoje guardo otimas lembranças de Témis e guardamos contato até hoje! 
La recebiamos também estudantes do terceiro ano de medicina, era bem bacana a troca e os estudantes saiam impressionados com a qualidade do atendimento num fim-de-mundo como aquele. O dia-a-dia de uma enfermeira num hospital tao pequeno parece coisa de tevê, onde todos os personagens se cruzam!

E foi em Témis que eu cobri férias no CHSLD, o que rendera o capitulo 4 dessa historinha ....



6 commentaires:

  1. Fiquei de novo com vontade de conhecer Temis! :)

    bjinz
    Erika

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  2. Voce esta acendendo a luz do meu tunel: tinha desistido de enfrentar ... Obrigada por dividir...

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    1. Ninguém dúvida de que o caminho pode ser bem difícil e tortuoso, mas vale a pena! Enfermeiros são super reconhecidos e valorizados por aqui. Uma vez a barreira da OIIQ vencida, o céu é o limite e as portas não se abrem, elas se escancaram!!

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  3. Ler seu blog faz bem especialmente porque vejo alguém que gosta do que faz, traz resultados positivos e fala de desafios. Nesse sentido, é uma pena o que se transformou a nossa profissão aqui no Brasil... desestimulante... Abraços Jaq

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